Entrevista a Ana Verde de Oliveira

Estivemos à conversa com Ana Verde de Oliveira que tem sido a força motriz por trás das jornadas europeias do Património em Leiria. Proprietária de uma histórica casa do século XVIII nesta cidade, pertencente à família Oliveira, apesar de ainda estar à espera de licenciamento para obras, isso não a tem impedido de contribuir ativamente para o panorama cultural da cidade.

No passado dia 16 de setembro, juntamente com o CEARTE, Ana promoveu uma palestra intitulada

“A situação atual do artesanato em Portugal, meios de reconhecimento, salvaguarda e promoção”

Questões que todos os dias nos colocamos. O evento reuniu alguns apaixonados e algumas das mais tradicionais formas de artesanato do nosso país. As rendas de Birlos de Peniche, as icónicas Mantas de Menizes D’Aire, a inconfundível Cerâmica de Bajouca, os Azulejos artísticos do Juncal ou a Cerâmica tradicional do Moinho.

Filipa – Ana, já há 12 anos que organiza as Jornadas Europeias do Património em Leiria. Porquê este ano voltar os olhos para o artesanato?

Ana Oliveira – Há 12 anos comecei as jornadas. Comecei por fazer visitas guiadas, depois fiz vários workshops, outro tipo de ações com outras temáticas também. Este ano, uma vez que cada ano é sobre um tema, era sobre o património vivo: o saber fazer, o passar de geração para geração e considerei que era realmente o momento oportuno para organizar as Jornais Europeias do Património e sobretudo com foco no artesanato regional da Leiria e da região.

Filipa – Quando pensou no evento, de que forma é que tinha pensado fazê-lo? Convidou algumas dessas marcas, desses artesãos tradicionais e também convidou o CEARTE para estar neste evento. Conte-nos quais eram as suas preocupações e o que gostava de ter como resultado deste encontro?

Ana Oliveira – Normalmente o que eu faço é uma forma de dar a conhecer os vários artesãos da região e é uma forma também de dinamizar o próprio património privado. São as duas coisas. E não é a primeira vez que eu convido pessoas a virem falar sobre o tema.

Por exemplo, quando foi o ano europeu do património cultural, convidei o arquiteto Helder Carita para falar sobre a Casa Senhorial em Portugal, convidei o senhor José Meco para falar sobre as artes criativas do século XVIII, já têm vindo várias personalidade. Este ano achei conveniente convidar alguém que esteja dentro de toda esta problemática do artesanato e contactei o CEARTE que amavelmente aceitaram o convite. Vieram pessoas, tanto os artesãos como pessoas que estão ligadas também ao setor e penso que seja muito útil a informação que foi partilhada.

Também tenho outra informação a dar. Eu faço parte da Associação das Casas Antigas, agora vai ser a Associação Portuguesa das Casas Históricas, e essa associação, por sua vez, associada à European Historic Houses Association em Bruxelas. Organizam conferências e muitos eventos também. E numa dessas conferências na Comissão Europeia, eu conheci uma senhora que está muito ligada ao artesanato com o portal Mad’ in Europe, que eu já tive a oportunidade de conhecer.

O que eu comecei a fazer foi contactar os artesãos aqui da região, falar-lhes sobre o portal, dizer as vantagens que tem em fazer em parte , e eles depois tomam uma decisão. Um dos projetos que já consegui integrar foi a artesã Maria Gameiro

Filipa – Mas vamos voltar aqui às jornadas europeias do património. De facto, a Ana também dinamiza aqui uma série de atividades numa casa que por si só já é bastante especial. Falem-nos um pouco dessa casa, onde costumam acolher estas iniciativas.

Ana Oliveira – A casa pertence à minha família desde o século XVIII. Era uma segunda residência do meu pentavô Joaquim da Oliveira, que era do Real Corpo de Engenheiros, e o Coronel e arquiteto, que participou na Estrada Real de Rio Maior, portanto, a casa pertence à família desde essa altura.

O imóvel passou de geração para geração, eu nunca morei cá, quem morou foram os meus avós e o meu pai, por algum tempo. Eu não morei mas vinha sempre de férias e sempre gostei muito da casa, eu gosto de estar nesta casa e quis recuperá-la. Quis realmente fazer um pequeno alojamento, uma coisa não muito grande, três quartos, mas sempre ajuda na rentabilização e começar a fazer visitas guiadas e eventos.

Eu em 2005 já fiz a substituição da cobertura do telhado, com capitais próprios. Agora, como a casa está em mau estado, porque os estuques estão em mau estado, tudo precisa de restauro. E então, como há tantos financiamentos a nível europeu, resolvi realmente candidatar-me a um financiamento. Desde 2017 que eu entreguei a candidatura à entidade bancária. Mas para poder fazer os trabalhos, começar as obras, preciso de licenciamento. Não posso, de forma nenhuma, candidatar-me e aprovar a candidatura, enquanto não entregar o licenciamento.

Filipa – e agora?

Ana Oliveira – Demorou demasiado tempo, a casa está a degradar, a pessoa também tem tudo na cabeça, gostava de já ter a casa como deve ser e realmente dinamizar aqui toda uma série de atividades, fomentar o turismo, dinamizar com eventos… Finalmente na semana passada consegui obter o licenciamento.

Filipa – ótimas notícias!

Filipa – Ana, conta-me lá, como é que vai da economia para uma agente cultural? Como é que isso aconteceu na sua vida?

Ana Oliveira – Tirei Economia na Universidade Livre em 1983. Como era complicado arranjar trabalho fui para fora e fiz vários estágios no estrangeiro: em França, na Holanda e em Inglaterra. Depois voltei, continuou a ser também complicado e estava a fazer estudos europeus na Universidade Católica.

Mas depois, entretanto, tinha um relacionamento na Holanda e resolvi mudar-me para lá. Comecei a aprender holandês, morei na Holanda há 4, 5 anos, falo holandês. E foi na Holanda que eu comecei a fazer estudos de mercado, para o, como disse, para o Instituto Comércio Externo.

Filipa – Ana, voltando a Leiria, estamos a falar de mais de 10 anos de ações que tem promovido ao abrigo das jornadas europeias do património. Focando neste tema, qu nos diz bastante, olhando agora para o evento de dia 16 de setembro, quais foram as principais estratégias discutidas para promover então o artesanato português? Aqui ao abrigo do mote da vossa palestra, que era reconhecimento, salvaguarda e promoção.

Ana Oliveira – Pronto, essa palestra era mais vocacionada para os artesãos. O CEARTE falou principalmente de políticas que devem ser seguidas pelos artesãos e eu não estou dentro dessa área. A minha atuação foi no sentido de convidar alguns artesãos aqui da região.*

*O CEARTE facultou o documento apresentado que disponibilizamos aqui:

Filipa – O que espera do futuro? Será a recuperação da casa agora que finalmente, passados estes anos, teve licenciamento? É um momento bom. É uma forma de chegar ao fim de 2023 com um futuro que se abre para este projeto.

Ana Oliveira – Sim, neste momento realmente gostaria de fazer as obras o mais rapidamente possível, estou outra vez em contato com a entidade bancária. A casa ficar, portanto, o pequeno alojamento de três quartos, fomentar o turismo, não é? E realmente ser possível as pessoas hospedarem-se em casa.

E também gostaria depois de organizar eventos e visitas guiadas, tudo, uma série de outras atividades também. Gostaria também de manter contato com o artesanato. Manter um projeto através de música que também tenho organizado concertos e tenho integrado o Early Music Day.

Filipa – Ana, nós seguiremos atentos. Esta informação, para quem não conhece, está divulgada no Facebook que nós também vamos partilhar. Obrigada pela sua disponibilidade para estarmos aqui a conversa um pouco.

Ana Oliveira – Sou eu que agradeço, Filipa, que gostei imenso.